Eu me importo mais com sua opinião do que deveria

Há muitos anos que conto uma mentira para mim mesmo que sempre foi fácil de eu acreditar. Eu não me importava com a opinião dos outros.

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Há muitos anos que conto uma mentira para mim mesmo que sempre foi fácil de eu acreditar. Também não foi difícil de convencer os outros de que era verdade. Eu vendia para todo mundo que eu não me importava com a opinião dos outros ao meu respeito. Isso fazia com que eu fosse um pouco excêntrico com algumas coisas e me divertisse com isso. Principalmente quando esta característica não era necessariamente popular

"Se você me conhece ao menos um pouco, deve estar achando uma surpresa ler o título do texto e o parágrafo anterior, mas acredito estar escrevendo a verdade. Encarar essa verdade tem me ajudado a seguir em frente e talvez publicar seja mais um passo em diante

emoticons de coração sorriso e joinha

Indícios de que não me importava

"Sempre tive uma fama de ser excêntrico em algumas opiniões e me divertia com isso. A maioria das pessoas que não tem carro, mas começa a trabalhar com um salário que permita comprar vai lá e compra um? Vou andar de ônibus, metrô ou taxi – não existia Uber e este último eram o que mais achavam estranho. Compro roupa no mercado e me acham mão-de-vaca? Conto para todo mundo achando graça toda vez que compro uma peça nova. Poucos esperavam que eu largasse o emprego? Larguei

"Mesmo com vários amigos usando o celular da moda, eu nunca tive um. Lembro da primeira vez que tive a oportunidade de viajar para o exterior, onde todo mundo comprava muita coisa. Voltei com seis pares de meias brancas, três camisas também brancas e uma camiseta que ganhei por pagar $10 em um estacionamento privado em um Outlet. Contava para todo mundo achando engraçado as reações

"Até mesmo viajar para o exterior foi um processo curioso. Viajei pela primeira vez de avião com 19 anos. O detalhe é que nunca tinha viajado de ônibus também. E de carro, com a família, três vezes, antes dos 9 anos de idade. Comecei a viajar com frequência depois dos 25, quando meu trabalho passou a permitir, e decidi que mesmo tendo recurso para ir para fora, queria conhecer o Brasil primeiro. Ao contrário de quase todos que trabalhavam comigo

E por que eu não me importava?

Cachorro com uma máscara engraçada como se tivesse disfarçado

"O maior motivo de eu começar a me importar menos com a opinião das pessoas foi um instinto de sobrevivência e uma lógica que inventei na minha própria mente. Eu percebi logo no começo da vida adulta que a opinião dos outros tinha pouco a ver comigo

"As pessoas, boa parte de vezes, me viam até o ponto que as lentes do mundo delas permitiam elas verem. Além de jogarem em mim um monte de opiniões formadas antes mesmo de saber quem eu era. E se você tem uma opinião sobre algo que não conhece, você se baseia muito mais em sua própria experiência do que na pessoa ou objeto desconhecido

Sempre usamos nossa bagagem para julgar os outros, mas meu receio é quando se usa apenas ela

"Quando eu estava na faculdade, duas colegas conversavam na minha frente sobre eu gostar de beber cerveja ou não. Uma afirmava que eu não parecia ficar bêbado. Mesmo se bebesse muito. A outra se apegava a parte de não eu parecer embriagado, mas concordava dizendo que era impressionante que eu nunca bebia cerveja, ou mesmo nada com álcool, e como eu conseguia

"Elas conversaram por vários minutos sobre o assunto e concordaram entre si. Falando de coisas diferentes. A primeira, a época namorada de um grande amigo que convivo até hoje, era acostumada a me ver no bar. Fora do período de aulas. Geralmente em lugares que eu carregava uma cerveja na mão. Ela falava sobre os efeitos, ou falta deles, do álcool em mim

"A segunda era da minha turma e só lembrava de eu nunca ter saído com ela e os colegas que ela saia. Ela achava que isso era motivado pelo fato de eu não beber. Ela falava sobre eu não socializar fora do período de aulas e de não ingerir bebidas alcoólicas. Pelo que sei, até hoje as duas tem a mesma opinião sobre mim

"Assim, se a opinião dos outros sobre mim tem apenas uma leve influência da verdade, por que iria me preocupar? Talvez você ache que eu devesse ter interferido na conversa e dado minha opinião. Eu estava me divertindo demais para interromper o processo e depois cheguei à conclusão que se eu fosse tentar interferir em toda situação, seria uma batalha sem fim

"Sei que muita gente sabe sobre essa incoerência, mas poucas levam esse conhecimento para a prática. Vivemos nossa vida julgando o mundo baseado nas nossas próprias experiências e esperamos que os outros nos julguem de forma diferente

Eu mentia tão bem, que comecei a acreditar

"Talvez ao ler os parágrafos anteriores, meu comportamento não pareceu gerar nenhum tipo de efeito negativo. Desde que eu estivesse fazendo o que estivesse mais alinhado com meus valores e minhas vontades, tudo estava indo bem

"O problema é que comecei a acreditar demais nessa identidade de não me importar e de fazer diferente do que a maioria estava fazendo. Isso foi fazendo com que ficasse difícil eu admitir quando tinha vergonha de algo. Quando eu queria fazer alguma coisa, mas não tinha coragem. Eu acabava racionalizando na minha cabeça que não fazia por não importar com o que pensavam

"Vou dar um simples exemplo. Eu sempre fui um sujeito de fazer graça e rir um bocado. Não é raro alguém que acaba de me conhecer dizer que meu sorriso é uma das coisas que mais chamam a atenção quando vão lembrar de mim depois. Talvez pelo fato de eu não ser alguém que economiza em sorrir

"Só que por anos eu tinha uma vergonha danada de ter os dentes tortos. Eu racionalizava que a vergonha era um problema meu. Não falava muito a respeito e era algo que eu acreditava que não fazia diferença na minha vida. Assim, apesar da vergonha eu engolia o orgulho e seguia sorrindo

"Isso não quer dizer que o problema desaparecia. Eu evitava aparecer em fotos sorrindo do lado do dente que era mais torto. Inclusive eu sempre evitei aparecer em qualquer foto e não consigo deixar de desconfiar que este era um dos motivos. Claro que a história que eu contava para mim mesmo era outra

"Tinha uma série de razões por trás da vergonha em relação aos meus dentes que eu nunca tinha encarado, até um ano atrás. Ano que tirei o aparelho dos dentes, pois resolvi corrigir a situação. Sendo que coloquei o aparelho por acaso, e não porque admiti ser um problema. Essa situação toda me ajudou a abrir os olhos para várias coisas que eu estava colocando debaixo do tapete e o reflexo na minha vida em geral

Manter o mistério é mais fácil do que assumir minhas inseguranças

Homem misterioso abrindo a camisa como se fosse tirar o disfarce

"O fato de eu ter medos, vergonha, inseguranças que eu não compartilhava, começou a fazer com que eu me tornasse alguém mais reservado do que a média. Inclusive esse blog é um dos exercícios para conseguir ir contra este comportamento

"Eu justificava que era reservado por uma série de motivos, que hoje vejo não serem tão lógicos como pareciam. Alguns deles:

  • Não existe nenhum benefício real quando as pessoas sabem o que faço quando não estou na companhia delas. Geralmente existe um efeito negativo.
  • As pessoas tratam o que sabem da vida das outras pessoas com um respeito menor que o esperado pela pessoa observada. O que você conta em segredo, por exemplo, não será tratado como segredo por quem escuta se a informação não parecer relevante. E se a pessoa não tiver um alto interesse na relação, o fato de parecer importante vai aumentar a chance de não ser segredo.
  • Quanto mais informação você fornece, mais as pessoas têm ferramentas para te encaixar em um modelo na cabeça delas. O modelo não necessariamente tem a ver com a forma que você mesmo se enxerga.
  • Se eu não divulgo os problemas, por que iria sair por aí divulgando o que está dando certo? Eu achava que propagandear só o lado bom seria injusto com as pessoas que ouvem.

"Eu podia dar mais mil justificativas fajutas. No fim, a pergunta que me deixou intrigado e contribuiu para eu querer escrever este texto foi: se eu não me importo com a opinião dos outros, por que raios me importo com o que elas sabem de mim ou o que vão fazer com isso? E por que gasto tanta energia e exijo tanta discrição dos meus amigos em relação a mim

É muito mais fácil gerar um pouco de mistério por meio da omissão do quer revelar as coisas que eu tinha vergonha ao meu respeito

"Por exemplo, cresci em um local que a maioria dos meus amigos da faculdade não conhecia e que eles achavam perigoso. Eu tinha vergonha disso, então tentava omitir para as pessoas que eu conhecia onde eu morava. Eu mudei de lá e mesmo assim só anos depois que assumi essa vergonha para mim mesmo

"Sobre as viagens ao exterior. Eu tinha optado por não viajar ainda, mas eu também tinha vergonha de dizer que comecei a viajar depois de adulto. Que viajei a primeira vez de avião aos 19 anos. Isso era uma evidência de muitas coisas do meu passado que eu não lidava bem. Parecia mais legal dizer que era reservado ao esconder quando fiz minha primeira viagem do que dizer que eu achava que não ter dinheiro para viajar antes parecia um problema

Encontrando o equilíbrio

Eu não tenho a mínima pretensão de dizer que vivo buscando aprovação das pessoas ao meu redor. No entanto, não posso negar que gosto de ser elogiado, que me incomoda uma crítica negativa, que gosto de encontrar pessoas parecidas comigo, que tenho medos em relação ao futuro, que as vezes me sinto sozinho, que tenho inseguranças a respeito da minha aparência, que me preocupo com o que você vai achar ao ler isso tudo, que me preocupo se alguém vai ter interesse em ler isso tudo. Negar não me ajuda a lidar melhor com nenhuma dessas situações

"Também não vou deixar de manter minha privacidade. Não vou chegar ao ponto de abrir minha rotina nas redes sociais, como muitos não vem nenhum problema em fazer. Não tem a ver comigo. O que preciso neste momento é encontrar um equilíbrio, que deve ser específico para cada um de nós, que não me deixe cego em relação aos comportamentos que me paralisam

O importante não é não me importar. É o que vou fazer quando me importar que vai fazer diferença.

"Quero ter a sabedoria de distinguir as situações onde minha opinião sobre mim deve ser mais relevante que a dos outros. Quero ter a humildade de entender onde a opinião das outras pessoas serve para melhorar meu comportamento.

"Ter a consciência quando a opinião que espero que os outros tenham é apenas uma ilusão criada pelas minhas próprias crenças. Pegar tudo isso e ser alguém que tenho mais orgulho de ser

"Acredito que confessar que eu me importo com sua opinião mais do que eu deveria, é um primeiro passo para chegar lá. Quem sabe? Depois de escrever aqui não posso dizer que não estou tentando

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